sábado, 7 de junho de 2008

Liberdade sem Medo (artigo livre)

A limitação do homem é ele quem a impõe a si mesmo. O medo incontrolado o detém, porque ele não conseguiu – ou não sabia – sobrepor a razão em relação à emoção. A falta de auto-conhecimento condena o homem à submissão e o expõe a todo tipo de violência, desrespeito e desumanização que a sociedade capitalista atual exerce sobre ele.
O capitalismo, que só almeja abastecer sua máquina de faturamento, triunfará. Ali não há lugar para sonhos, escolhas e meditações. O medo de fazer, ousar, criar... Medo de dizer, de desejar. O homem criou o Estado, que recriou o homem. Somos produtos de nós mesmos, afastando-nos, cada vez de uma forma, da liberdade. Liberdade individual, liberdade total.
De onde surgiu o medo de ser livre? Tenho para mim o pensamento de que o medo é inato ao homem, mas este deixou de dominá-lo por motivos externos ao próprio homem, que influenciaram suas ações e percepções. Se você não sabe que está preso, não irá procurar a porta para sair dessa condição. Se souber que está preso, mas desconhecer o motivo, não saberá se defender no dia do seu julgamento. E quem são os juízes? Você não os conhece. Mas eles, sim, te conhecem e sabem das suas fraquezas. Logo, vão te manipular facilmente.
Aqui, uma pausa: Não se trata de onipotência, mas de conhecimento e controle. Distanciamento e visão. Se todas as possibilidades forem analisadas, é mais fácil a escolha. Ciente dos seus medos e das suas falhas, o homem as subjugará e dominará a situação, controlando as ações à sua volta (e também suas próprias ações), de modo que estas não afetem a sua liberdade e dignidade. Os defeitos humanos ali permanecem, mas a fortaleza já se estabeleceu.
Em determinado momento, as verdades vão se confrontar. De que lado cada uma delas vai estar? Quantos lados há? Creio que não exista verdade absoluta, mas também não existe verdade falsa ou errada. Todas são válidas e incomparáveis em valor entre si, cada qual com sua origem e justificativa. Num duelo entre duas verdades, obtém o êxito aquela que se apresenta sem medo. O medo destrói qualquer possibilidade de argumento e este é o alicerce de qualquer verdade.
Limitado à emoção, o homem interrompe seu acesso linear à razão, distorcendo suas próprias verdades, que haviam composto anteriormente suas convicções. Ele, então, se vê no vazio da incerteza e provavelmente vai se perder nesse labirinto depressivo onde a auto confiança é nula. Ele vai precisar de ajuda alheia, que o guiará de volta à luz e à sabedoria. Saberá escolher a ajuda certa? O que está em questão nesse momento? A sorte? Surgem os mediadores, conhecedores da amplitude dos fatos, seus protetores ante o júri da vida. Protegê-lo-ão, mas não gratuitamente. O que o homem já vendeu para libertar-se? E que liberdade atingiu? Conseguiu se livrar da insegurança. Está protegido pela nova fé estabelecida e já não sente a angústia que o medo provoca, mas não vê que se limitou à própria fé para se inserir nessa condição. Refez a sua verdade e alicerçou ali seus argumentos efetivamente.

Nesta noite, eu sonhei que relembrava todos os sonhos que havia tido. E realmente tive aqueles sonhos em outras noites. Acordei febril, distante. Há aqui a inconformidade que eu revelo assistindo ao telejornal. Nem se fala em liberdade, só de conformidade. A comodidade toma o lugar da justiça e os perdões vêm fáceis demais, falsos demais. O homem é mau. É esta a sua natureza: deixa morrer de fome milhões de crianças por ano. E as que sobrevivem, trabalham para não se deixar levar ao mesmo fim das outras. O homem é egoísta e dificulta qualquer avaliação positiva a seu respeito. Estou falando de mim, inclusive. Eu não salvei nenhuma criança da morte por inanição. Não assumi nenhuma causa política em busca da igualdade. Apenas me limito a escrever este texto. Com egoísmo, protejo meus defeitos e fortifico minhas verdades. Sobrevivo nos intervalos da vida em que esta é impossível.
Quando a razão é requerida, faz-se presente sem pressa. Não mais julgo o próximo. Passo o tempo a observar e raciocinar, absorvendo sabedoria e informação com algumas raras pessoas. Detive meu medo, conheci o seu lugar e o mantenho são.
Reconhecer a superioridade do inimigo é o primeiro passo para se tornar seu igual. A vaidade é máscara que borra a verdadeira imagem, distanciando o homem da liberdade que o faria mais humano. Não se trata de um texto panfletário este que o leitor tem em mão, mas de uma visão particular em detrimento à realidade que a mim se dispõe. Não estabeleço aqui regras. Ao contrário, gostaria de desfazer todas elas! Não estaria eu também tomada pela verdade de um mediador sem fonte confiável? Essa questão é válida, mas estou segura quanto à resposta. Desfiz-me dos vários mediadores que a mim apresentaram propostas. Precisei deles enquanto estive mergulhada no vale da depressão. Reestabeleço-me sobre minhas pernas, adquirindo meu equilíbrio natural.
Retomo a dúvida que levantei anteriormente. Teria o homem capacidade de escolher seu mediador? Eu não tive essa capacidade. A sorte, porém, interveio em meu favor e recebi direcionamento adequado. Despi-me de toda a fé que havia construído anteriormente e me observei com digna distância. É um caminho solitário e longo que poucos (dentre os que o conhecem) se dispõem a fazer.
Saber que as dúvidas existem e não se afobar em completar seu vazio natural, não hesitar em reconhecer a existência do medo diante do desconhecido é uma maneira adequada para deter a falta de controle. Esta é a virtude que batizo como coragem. Como eu já afirmei, medo é uma sensação inata ao homem. Cabe a ele dominá-lo. Isso requer treino, concentração e disciplina. Não vejo facilidade em atingir esse estágio. É preciso, porém, que se admita a dificuldade em atingir essa contemplação, desfazendo-se o homem de qualquer fantasia. A fantasia é outro obstáculo diante da liberdade, do livre arbítrio que existe, desvencilhado de qualquer quantidade de culpa.
Ser livre é, portanto, saber-se livre.

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